sexta-feira, 15 de maio de 2015

Escravidão doméstica X Escravidão mercantil

Escravidão doméstica

Forma de escravidão na qual os cativos são absorvidos, em uma posição subalterna, a um grupo de parentesco, e passam a ser empregados na produção de alimentos e utensílios a serem consumidos pelo próprio grupo.
Via de regra, em sociedades onde vigora esse tipo de escravidão os cativos são pouco numerosos. De modo geral, a pessoa passa à condição de escravo por dívidas contraídas por ela mesma ou por membros de sua família, como punição por crimes ou por ter sido capturada em uma guerra. Ela não pode ser comprada, vendida ou trocada. É comum que a pessoa escravizada, segundo essa forma, se case dentro do próprio grupo de parentesco, que incorpora sua descendência, seja em uma posição subalterna ou em uma situação de igualdade potencial com os demais membros da mesma idade.
Na África, nos locais onde a centralização política foi mais marcante, a escravidão doméstica começou a passar por transformações. O número de escravos crescia constantemente e eles passavam a ser cada vez mais importantes na produção de alimentos, em geral para sustentar uma classe de guerreiros ou de funcionários palacianos. No entanto, eles continuavam a ser obtidos por meio de guerras, e não por transações comerciais. Em outras palavras, o escravo não era uma mercadoria, nem era usado para produzir mercadorias.


Escravidão mercantil

Sistema econômico no qual a produção da riqueza de uma sociedade, geralmente inserida em um amplo circuito de trocas comerciais, baseia-se fundamentalmente no trabalho escravo. Para essas sociedades, o escravo é uma mercadoria, destinada a produzir outras mercadorias a serem vendidas no mercado externo.
Embora a utilização de mão-de-obra escrava tenha praticamente desaparecido na Europa durante a Idade Média, ela continuou a existir nos litorais do Mediterrâneo e no Oriente Médio, especialmente nas zonas sob a jurisdição do Califado, que era então um enorme império que unificava todos os muçulmanos, da Península Ibérica e do sul da Itália às fronteiras da China e dos diversos Estados da Índia, passando pelo norte da África. Com o tempo, seus mercadores alcançaram a África Ocidental e os portos da África Oriental, integrando essas duas regiões no comércio mundial e contribuindo para a introdução, em alguns desses locais, da escravidão mercantil.
Excetuando-se o Império Bizantino, a Europa era então uma região periférica, pobre e desorganizada politicamente, e que servia apenas como zona de captura de escravos e de saque para os exércitos muçulmanos. Apenas a partir do século X, com a fragmentação política do Califado, a Europa começaria lentamente a se fortalecer, em grande medida através da incorporação de diversas inovações técnicas, econômicas e culturais trazidas de diversas partes do mundo pelos muçulmanos.
A partir do século XIV, Portugal passou a se interessar pelo comércio africano, especialmente em duas mercadorias: ouro e escravos. O ouro era necessário para cunhar as moedas aceitas pelos comerciantes hindus, islâmicos ou chineses em troca de especiarias e artigos de luxo, como seda e perfumes. Os escravos continuavam sendo utilizados no sul da Europa para a produção de alimentos, vinho e azeite de oliva.
A primeira experiência portuguesa com a escravidão mercantil ocorreu nas ilhas atlânticas: para Cabo Verde eram levadas pessoas escravizadas no golfo do Benim para que produzissem têxteis, que, por sua vez, era trocado por ouro nas regiões produtoras da África Ocidental. Na ilha da Madeira, o vinho, vendido na Europa, também era produzido com mão-de-obra escrava. Mais tarde, os escravos comprados na região do Congo-Angola foram incorporados a esse circuito, que passou a incluir também a produção de açúcar em São Tomé. Essas experiências escravistas foram mais tarde aplicadas às possessões portuguesas nas Américas, no território que viria a ser o Brasil.
A escravidão mercantil apresenta com frequência dois desenvolvimentos colaterais.
O primeiro é que, por ser uma mercadoria cara, o escravo torna-se um item fundamental do consumo conspícuo, ou seja, ele passa a ser adquirido e exibido publicamente como prova do status social superior de quem o possui. No Brasil, esse processo foi bastante comum – os viajantes estrangeiros que passaram por aqui registraram isso muito bem. [ver escravidão conspícua]
O segundo é que, em ocasiões em que a demanda militar não é suportada pelo contingente populacional de homens livres, sociedades escravistas tendem a formar contingentes militares de escravos. Isso pode ocorrer quando há pretensões de expansão territorial, quando há necessidade de defesa contra um inimigo mais poderoso, ou quando é necessário conter dissensões e revoltas internas (nesse caso, os homens livres que compõem os exércitos comuns poderiam simplesmente aderir à revolta, em função de lealdades familiares ou locais). Esse processo ocorreu, por exemplo, no império de Oyó, na África Ocidental. [ver escravidão ancilar].
No cômputo geral, entretanto, a quantidade de escravos soldados ou de escravos utilizados apenas como indicativo de status sempre foi incomparavelmente menor que o número de escravos empregados na produção de mercadorias. É essa preponderância que nos permite falar de um sistema de escravidão mercantil.
É importante salientar que, no mundo muçulmano, a escravidão não tinha inicialmente um caráter racial, como parece ter tido desde muito cedo na Europa. Os escravos eram de muitas cores e vinham de qualquer lugar – dos campos da Europa Ocidental, das planícies da Ásia Central, do entorno do Mar Negro ou da Índia. Entretanto, enquanto, nessas regiões, diversos fatores contribuíram para limitar e mesmo extinguir a captura e o comércio de escravos entre os séculos XIV e XVII, a região africana se consolidou como a principal região fornecedora para o mundo muçulmano, papel que desempenhou até o fim do século XIX. Como resultado disso, passou a haver uma correlação entre escravidão e raça, baseada principalmente nas formulações cristãs europeias sobre o tema, em especial as que envolviam o episódio bíblico dos filhos de Noé.

FONTE: FIGUEIREDO, Fábio Baqueiro. Glossário. In: História da África. Salvador: CEAO/UFBA, 2011.


terça-feira, 12 de maio de 2015

Palestra “Africanos libertos, catolicismo e a articulação de uma comunidade mercantil (Agoué 1840-1860)” - BA



A Fundação Pedro Calmon, através do Centro de Memória da Bahia, convida a todo(a)s para participar da 13ª edição do curso Conversando com a sua História. A palestra de abertura tem como titulo “Africanos libertos, catolicismo e a articulação de uma comunidade mercantil (Agoué 1840-1860)”, e será ministrada pelo professor Dr. Luis Nicolau Parés, em 18 de maio de 2015, às 17 horas, na sala Kátia Matoso – auditório da Biblioteca Pública do Estado da Bahia.

Mais informações e inscrição através do contato cmb.fpc@fpc.ba.gov.br/3117-6067