Na história do Brasil, as Comunidades Quilombolas são e sempre foram exemplo de organização social, assim como as comunidades negras em toda diáspora africana. Como evidência dessa importante forma de organização, estimamos existir atualmente cerca de 5.000 comunidades quilombolas em todo território nacional, com histórias que vão desde pouco menos de 100 anos de formação a séculos de existência.
Hoje, essas milhares de comunidades vêm formando grande rede de articulação em vários níveis: organizações locais, municipais, regionais, estaduais e nacional, essa última representada pela CONAQ (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas), hoje com presença em quase todas as Unidades da Federação.
Essa crescente mobilização das Comunidades Quilombolas tem trazido importantes resultados na construção de uma política de Estado que reconheça os direitos desse grupo, que vai desde a criação do Artigo 68 do ADCT (Atos das Disposições Constitucionais Transitórias) e outras citações contidas na Constituição Federal de 1988, passando por decretos, portarias, instruções normativas, tratados internacionais e legislações editadas pelos governos estaduais.
Dessas conquistas, vale destacar o decreto 4.887, assinado pelo Presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, em 20 de novembro de 2003, regulamentando os procedimentos técnicos e administrativos para o reconhecimento, demarcação, delimitação e titulação dos territórios quilombolas, que traz o critério de auto-reconhecimento, como elemento básico para o início do processo de regularização. Ele traz outros avanços no que diz respeito à regularização fundiária e ainda cria o Programa Brasil Quilombola, que destina recurso de vários órgãos do Governo Federal para o desenvolvimento social e econômico das comunidades.
A partir da criação do decreto, o número oficial de comunidades identificadas no país passou de 743 para mais de 3.000, o que gerou grande preocupação no setor fundiário, seguida de forte estratégia na tentativa de anulação dos direitos quilombolas, puxada pela bancada ruralista, empresas do agronegócio e grupos de comunicação.
Além da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3239/04), de autoria dos Democratas, ex-PFL (Partido da Frente Liberal), em tramitação no STF (Supremo Tribunal Federal), que contesta a constitucionalidade do decreto 4887/03, existem atualmente os seguintes projetos no Congresso Nacional:
- PDC 44/07 de autoria do Deputado Federal Valdir Colatto (PMDB-SC) que pede a anulação do decreto 4887;
- PL 3654/08 de autoria do mesmo deputado, que 'regulamenta' o artigo 68 do ADCT, segundo os interesses da bancada ruralista;
- PEC 190/00 de autoria do Senador Lúcio Alcântara (PSDB/CE), que exclui o Artigo 68 e insere novo item (no Capítulo VIII, Título VIII, seria o artigo 232-A), que apresenta outra redação para o texto do Artigo 68, com o problema de sugerir tratar-se de indivíduos e não coletividades e de indicar que a titulação deverá ser feita "na forma da lei", sem dizer qual seria essa lei.
- PL 6264/05, aprova o Estatuto da Igualdade Racial, havendo uma forte pressão para a retirada do texto que trata dos territórios quilombolas de dentro do Estatuto.
A situação acima apresentada demonstra o quanto as comunidades quilombolas têm incomodado os grileiros e latifundiários em todo país. Para piorar, além desses procedimentos jurídicos e legislativos, acontece atualmente, em todo país, uma série de ações de violência contra famílias quilombolas, negação da identidade étnica do grupo, pedido de reintegração de posse por parte de fazendeiros e criminalização do movimento social quilombola.
Importantes grupos de comunicação fazem uso da concessão pública para se colocarem a serviço dos ruralistas. Órgãos do Estado Brasileiro também tem atuado em favor desses grupos (Polícias Militar, Civil e Federal, órgãos ambientais, etc) e o próprio judiciário, em alguns casos.
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