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CALENDÁRIO NEGRO – DEZEMBRO

1 – O flautista Patápio Silva é contemplado com a medalha de ouro do Instituto Nacional de Música, prêmio até então nunca conferido a um negro (1901)
1 – Nasce no Rio de Janeiro (RJ) Otto Henrique Trepte, o compositor Casquinha, integrante da Velha Guarda da Portela, parceiro de Candeia, autor de vários sambas de sucesso como: "Recado", "Sinal Aberto", "Preta Aloirada" (1922)
1 – O líder da Revolta da Chibata João Cândido após julgamento é absolvido (1912)
1 – Todas as unidades do Exército dos Estados Unidos (inclusive a Força Aérea, nesta época, uma parte do exército) passaram a admitir homens negros (1941)
1 – Rosa Parks recusa-se a ceder o seu lugar num ônibus de Montgomery (EUA) desafiando a lei local de segregação nos transportes públicos. Este fato deu início ao "milagre de Montgomery” (1955)
2 – Dia Nacional do Samba
2 – Nasce em Magé (RJ) Francisco de Paula Brito. Compôs as primeiras notícias deste que é hoje o mais antigo jornal do Brasil, o Jornal do Comércio (1809)
2 – Nasce em Salvador (BA) Deoscóredes Maximiliano dos Santos, o sumo sacerdote do Axé Opô Afonjá, escritor e artista plástico, Mestre Didi (1917)
2 – Inicia-se na cidade de Santos (SP), o I Simpósio do Samba (1966)
2 – Fundação na cidade de Salvador (BA), do Ilê Asipa, terreiro do culto aos egugun, chefiado pelo sumo sacerdote do culto Alapini Ipekunoye Descoredes Maximiliano dos Santos, o Mestre Didi (1980)
2 – Começa em Valença (RJ), o 1º Encontro Nacional de Mulheres Negras (1988)
3 – Frederick Douglas, escritor, eloquente orador em favor da causa abolicionista, e Martin R. Delaney fundam nos Estados Unidos o North Star, jornal antiescravagista (1847)
3 – Nasce em Valença(BA), Maria Balbina dos Santos, a líder religiosa da Comunidade Terreiro Caxuté, de matriz Banto-indígena, localizada no território do Baixo Sul da Bahia, Mãe Bárbara ou Mam’eto kwa Nkisi Kafurengá (1973)
3 – Numa tarde de chuva, em um bairro do subúrbio do Rio de Janeiro, é fundado o Coletivo de Escritores Negros do Rio de Janeiro (1988)
4 – Dia consagrado ao Orixá Oyá (Iansã)
4 – 22 marinheiros, revoltosos contra a chibata, castigo físico dado aos marinheiros, são presos pelo Governo brasileiro, acusados de conspiração (1910)
4 – Realizado em Valença (RJ), o I Encontro Nacional de Mulheres Negras, que serviu como um espaço de articulação política para as mais de 400(quatrocentas) mulheres negras eleitas como delegadas nos dezoito Estados brasileiros (1988)
5 – Depois de resistir de 1630 até 1695, é completamente destruído o Quilombo dos Palmares (1697)
5 – Nasce em Pinhal (SP) Otávio Henrique de Oliveira, o cantor Blecaute (1919)
5 – Nasce no Rio de Janeiro (RJ) o compositor Rubem dos Santos, o radialista Rubem Confete (1937)
5 – O cantor jamaicano Bob Marley participa do show "Smile Jamaica Concert", no National Hero's Park, dois dias depois de sofrer um atentado provavelmente de origem política (1976)
6 – Edital proibia o porte de arma aos negros, escravos ou não e impunha-se a pena de 300 açoites aos cativos que infringissem a lei. (1816)
6 – Nasce no Rio de Janeiro (RJ) Jorge de Oliveira Veiga, o cantor Jorge Veiga (1910)
6 – Nasce no Rio de Janeiro (RJ) Emílio Vitalino Santiago, o cantor Emílio Santiago (1946)
6 – Realização em Goiás (GO) do Encontro Nacional de Mulheres Negras, com o tema “30 Anos contra o Racismo e a Violência e pelo Bem Viver – Mulheres Negras Movem o Brasil” (2018)
7 – Nasce Sir Milton Margai, Primeiro Ministro de Serra Leoa (1895)
7 – Nasce no Rio de Janeiro (RJ) Luís Carlos Amaral Gomes, o poeta Éle Semog (1952)
7 – Clementina de Jesus, a "Mãe Quelé", aos 63 anos pisa o palco pela primeira vez como cantora profissional, no Teatro Jovem, primeiro show da série de espetáculos "Menestrel" sob a direção de Hermínio Bello de Carvalho (1964)
8 – Nasce em Salvador(BA) o poeta e ativista do Movimento Negro Jônatas Conceição (1952)
8 – Fundação na Província do Ceará, da Sociedade Cearense Libertadora (1880)
8 – Nasce no Harlem, Nova Iorque (EUA), Sammy Davis Jr., um dos artistas mais versáteis de toda a história da música e do "show business" americano (1925)
8 – Nasce no Rio de Janeiro (RJ) Alaíde Costa Silveira, a cantora Alaíde Costa (1933)
8 – Dia consagrado ao Orixá Oxum
9 – Nasce em São Paulo (SP) Erlon Vieira Chaves, o compositor e arranjador Erlon Chaves (1933)
9 – Nasce em Monte Santo, Minas Gerais, o ator e diretor Milton Gonçalves (1933)
9 – Nasce em Salvador/BA, a atriz Zeni Pereira, famosa por interpretar a cozinheira Januária na novela Escrava Isaura (1924)
10 – O líder sul-africano Nelson Mandela recebe em Oslo, Noruega o Prêmio Nobel da Paz (1993)
10 – O Presidente da África do Sul, Nelson Mandela, assina a nova Constituição do país, instituindo legalmente a igualdade racial (1996)
10 – Dia Internacional dos Direitos Humanos, instituído pela ONU em 1948
10 – Fundação em Angola, do Movimento Popular de Libertação de Angola - MPLA (1975)
10 – Criação do Programa SOS Racismo, do IPCN (RJ), Direitos Humanos e Civis (1987)
11 – Nasce em Gary, condado de Lake, Indiana (EUA), Jermaine LaJaune Jackson, o cantor, baixista, compositor, dançarino e produtor musical Jermaine Jackson (1954)
11 – Festa Nacional de Alto Volta (1958)
11 – Surge no Rio de Janeiro, o Jornal Redenção (1950)
12 – O Presidente Geral do CNA, Cheif Albert Luthuli, recebe o Prêmio Nobel da Paz, o primeiro a ser concedido a um líder africano (1960)
12 – Nasce em Leopoldina (MG) Osvaldo Alves Pereira, o cantor e compositor Noca da Portela, autor de inúmeros sucessos como: "Portela na Avenida", "é preciso muito amor", "Vendaval da vida", "Virada", "Mil Réis" (1932)
12 – Nasce no Rio de Janeiro (RJ) Wilson Moreira Serra, o compositor Wilson Moreira, autor de sucessos como "Gostoso Veneno", "Okolofé", "Candongueiro", "Coisa da Antiga" (1936)
12 – Independência do Quênia (1963)
13 – Dia consagrado a Oxum Apará ou Opará, a mais jovem entre todas as Oxuns, de gênio guerreiro
13 – Nasce em Exu (PE) Luiz Gonzaga do Nascimento, o cantor, compositor e acordeonista Luiz Gonzaga (1912)
14 – Rui Barbosa assina despacho ordenando a queima de registros do tráfico e da escravidão no Brasil (1890)
15 – Machado de Assis é proclamado o primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras (1896)
16 – Nasce na cidade do Rio Grande (RS) o político Elbert Madruga (1921)
16 – O Congresso Nacional Africano (CNA), já na clandestinidade, cria o seu braço armado (1961)
17 – Nasce no Rio de Janeiro (RJ) Augusto Temístocles da Silva Costa, o humorista Tião Macalé (1926)
18 – Nasce em King William's Town, próximo a Cidade do Cabo, África do Sul, o líder africano Steve Biko (1946)
18 – A aviação sul-africana bombardeia uma aldeia angolana causando a morte dezenas de habitantes (1983)
19 – Nasce nos Estados Unidos, Carter G. Woodson, considerado o "Pai da História Negra" americana (1875)
19 – Nasce no bairro de São Cristóvão (RJ) Manuel da Conceição Chantre, o compositor e violonista Mão de Vaca (1930)
20 – Abolição da escravatura na Ilha Reunião (1848)
20 – Nasce em Salvador (BA) Carlos Alberto de Oliveira, advogado, jornalista, político e ativista do Movimento Negro, autor da Lei 7.716/1989 ou Lei Caó, que define os crimes em razão de preconceito e discriminação de raça ou cor (1941)
21 – Nasce em Los Angeles (EUA) Delorez Florence Griffith, a atleta Florence Griffith Joyner - Flo-Jo, recordista mundial dos 100m (1959)
22 – Criado o Museu da Abolição, através da Lei Federal nº 3.357, com sede na cidade do Recife, em homenagem a João Alfredo e Joaquim Nabuco (1957)
23 – Nasce em Louisiana (EUA) Sarah Breedlove, a empresária de cosméticos, filantropa, política e ativista social Madam C. J. Walker, primeira mulher a construir sua própria fortuna nos Estados Unidos ao criar e vender produtos de beleza para mulheres negras. Com sua Madam C.J. Walker Manufacturing Company, ela fez doações em dinheiro a várias organizações e projetos voltados à comunidade negra (1867)
23 – Criação no Rio de Janeiro, do Grupo Vissungo (1974)
23 - O senador americano Jesse Jackson recebe o título de Cidadão do Estado do Rio de Janeiro e o diploma de Cidadão Benemérito do Rio de Janeiro durante visita ao Brasil, por meio do Projeto de Resolução nº 554 de 1996, de autoria do Deputado Graça e Paz (1996)
24 – João Cândido, líder da Revolta da Chibata e mais 17 revoltosos são colocados na "solitária" do quartel-general da Marinha (1910)
25 – Parte do Rio de Janeiro, o navio Satélite, levando 105 ex-marinheiros participantes da Revolta da Chibata, 44 mulheres, 298 marginais e 50 praças do Exército, enviados sem julgamento para trabalhos forçados no Amazonas. 9 marujos foram fuzilados em alto-mar e os restantes deixados nas margens do Rio Amazonas (1910)
25 – Nasce no Município de Duque de Caxias, (RJ) Jair Ventura Filho, o jogador de futebol Jairzinho, "O Furacão da Copa de 1970" (1944)
26 – Primeiro dia do Kwanza, período religioso afro-americano
27 – Nasce em Natal (RN), o jogador Richarlyson (1982)
28 – O estado de São Paulo institui o Dia da Mãe Preta (1968)
28 – Nasce na Pensilvânia (EUA), Earl Kenneth Hines, o pianista Earl “Fatha” Hines, um dos maiores pianistas da história do jazz (1903)
29 – Nasce no Rio de Janeiro (RJ) Édio Laurindo da Silva, o sambista Delegado, famoso mestre-sala da Estação Primeira de Mangueira (1922)
29 – Nasce em Diourbel, Senegal, Cheikh Anta Diop, historiador, antropólogo, físico e político (1923)
30 – Nasce no Rio de Janeiro (RJ) Maria de Lourdes Mendes, a jongueira Tia Maria da Grota (1920)
30 – Nasce em Cypress, Califórnia (EUA), Eldrick Tont Woods, o jogador de golfe Tiger Woods, considerado um dos maiores golfistas de todos os tempos (1975)
31 – Nasce no Morro da Serrinha, Madureira (RJ), Darcy Monteiro, músico profissional, compositor, percussionista, ritmista, jongueiro, criador do Grupo Bassam, nome artístico do Jongo da Serrinha (1932)
31 – Nasce na Virgínia (EUA), Gabrielle Christina Victoria Douglas, ou Gabby Douglas, a primeira pessoa afro-americana e a primeira de ascendência africana de qualquer nacionalidade na história olímpica a se tornar campeã individual e a primeira ginasta americana a ganhar medalha de ouro, tanto individualmente como em equipe, numa mesma Olimpíada, em 2012 (1995)
31 – Fundada pelo liberto Polydorio Antonio de Oliveira, na Rua General Lima e Silva nº 316, na cidade de Porto Alegre, a Sociedade Beneficente Floresta Aurora (1872)
31 – Dia dos Umbandistas



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segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Pingue-Pongue / Ângela Davis

‘O crime é uma questão de pobreza e segregação racial’
Alexandre Lyrio

No Verão de 1970, Angela Yvonne Davis integrava a lista dos dez fugitivos mais procurados pelo FBI. Acusada de envolvimento no seqüestro e homicídio de um juiz por ativistas negros, fugiu o quanto pôde até ser capturada, presa e julgada, em um dos mais famosos tribunais da história americana. Absolvida, quase pagou caro por fazer parte de um dos mais radicais movimentos comunistas do seu país, os Panteras Negras, espécie de braço armado do movimento Black Power.
Passaram-se 40 anos desde que os grupos anti-racismo explodiram nos EUA e, durante estada em Salvador para participar de diversas palestras, a ativista se mostrou a mesma revolucionária comunista de sempre. Sem se dobrar um só instante, defende os mesmos ideais de igualdade racial da época em que o líder negro Martin Luther King a inspirou a lutar pelos direitos civis dos negros. “O que mantém a minha sanidade é o meu envolvimento nos atuais movimentos coletivos políticos”, acredita. A verdade é que Angela Davis transformou-se em uma das mais obstinadas combatedoras da discriminação social e racial, além de defensora das mulheres. Mereceu composição de John Lennon e Yoko Ono em sua homenagem. A música Angela é uma ode à bravura da ativista e um protesto contra as perseguições sofridas por ela. Os Rolling Stones também a homenagearam com Sweet black Angel. Hoje, aos 64 anos, Angela Davis é escritora, filósofa e professora emérita da Universidade da Califórnia.
Nos últimos tempos, tem se dedicado ao estudo dos problemas ligados aos sistemas prisionais. Também aí, propõe uma revolução. Suas idéias deram origem a um grande movimento pela abolição do cárcere nos EUA e no resto do mundo. Sem nunca perder o viés racial, já que a esmagadora maioria dos prisioneiros americanos é negra, se refere ao sistema carcerário como uma “indústria”. Na capital baiana por ocasião da XI Fábrica de Idéias, evento organizado pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), nos últimos dias, Angela foi bastante assediada por representantes de movimentos sociais baianos, além de grupos de mulheres negras e autoridades religiosas do candomblé. Durante entrevista coletiva no Hotel da Bahia, falou sobre temas como política de cotas, comunismo e o candidado democrata à Presidência dos EUA, Barack Obama.

Correio da Bahia – Passaram-se 40 anos desde que movimentos negros como os Panteras Negras, do qual a senhora fez parte, bateram de frente com a segregação racial nos EUA. Quais foram as principais conquistas de lá para cá? Qual a atual situação dos negros nos EUA e na diáspora?
Angela Davis - Existem boas novas, mas também muitas más notícias. Nos últimos 40 anos, os negros americanos vivenciaram um progresso muito grande no que diz respeito a sua posição de classe, aos seus direitos civis. Se em 1968 a segregação vigorava no sul dos EUA, agora todas as leis que apoiavam aquele modelo foram banidas da legislação. Por outro lado, o processo de expansão do sistema capitalista teve conseqüências drásticas entre os negros que já eram pobres. Estes estão ainda mais pobres do que 40 anos atrás. Mas o grande avanço foi mesmo político. Antes os negros eram impedidos de participar do processo político do país. Hoje, podemos ver inúmeros representantes dentro dos sistemas federal e estadual. E agora temos até um candidato negro disputando a Presidência.

CB - Então a senhora e a população negra americana se sentem, de fato, representadas por Barack Obama?
AD - Acho que o fato de ele ser negro não é o principal. Quando se bate muito nessa tecla limita-se a percepção da sua importância. Ele não é só um simples candidato negro. Obama tem conseguido despertar discussões sobre diversas questões, inclusive as de raça, a ponto de mobilizar toda a juventude americana. Antes, os jovens dos EUA estavam estagnados, agora se pode testemunhar a formação de grupos envolvidos no processo.

CB - Mas a senhora vai votar em Obama?
AD - Pela primeira vez irei votar num candidato democrata. Devido à minha formação comunista, nunca votei em republicanos ou democratas. Essa será a primeira vez.

CB - Antes mesmo de Obama, recentemente outros negros americanos assumiram cargos importantes no país, como foram os casos dos últimos secretários de Estado, Colin Powel e Condoleezza Rice. A senhora respeita negros ligados ao governo George Bush?
AD - Há de se separar quem é quem. Condoleezza é uma mulher negra? Claro. Mas por outro lado ela representa as mais reacionárias forças políticas americanas. Eu sempre utilizo um exemplo como metáfora para ilustrar isso. Nos dias seguintes ao que o furacão Katrina devastou Nova Orleans, ela foi vista comprando os caríssimos sapatos Ferragamo, num elegante quarteirão da 5ª Avenida de Nova York. Ficou provado que ela não deu a menor importância ao desastre. Perguntada sobre o assunto, ela respondeu: “Racismo? Não existe racismo”. É por essas e outras que temos que ter muito cuidado com negros como Condoleezza e o próprio Colin Powel. Ofereço eles como exemplo, mas estou falando do nosso meio, do nosso dia-a-dia. Não podemos simplesmente convidar qualquer negro para os nossos movimentos. Podemos cair no erro de incorporar pessoas que são contrárias às ações afirmativas.

CB - Falando em ações afirmativas, foi uma universidade da Bahia, a Uneb, a primeira no país a criar o modelo de cotas para negros. Só depois a Ufba seguiu o mesmo caminho e outras instituições no Brasil. O que a senhora acha da política de cotas nas universidades brasileiras?
AD - Extremamente necessárias. Até outro dia, o Brasil era um país escravista, e isso foi herdado pelas gerações seguintes. As políticas afirmativas são extremamente necessárias para se resolver o problema da desigualdade. Mas a luta é muito maior. O Brasil precisa entender que a política de cotas é só o primeiro passo.

CB - Parece que esse tipo de política atualmente vem perdendo espaço nos EUA. Não pode acontecer o mesmo com o Brasil?
AD - Infelizmente, isso tem ocorrido. O que a gente vê nos EUA é o fortalecimento de ideologias contrárias às ações afirmativas, a ponto de alguns alunos negros e também latinos passarem a ter medo de ser identificados como beneficiados por esse sistema. Eles não querem mais que os colegas fiquem sabendo das bolsas que receberam para estudar. Acreditam que não merecem isso enquanto indivíduos. Mas é exatamente o fato de se enxergarem individualmente que os faz pensar assim. Eles não se imaginam como membros que fazem parte de uma comunidade cuja ascensão é atingida, em parte, a partir desse sistema. O projeto das ações afirmativas nunca foi usado para privilegiar indivíduos, e sim modificar estruturas que geram a desigualdade. Quando se visualiza apenas como indivíduo, não se é capaz de se enxergar o potencial de algo maior. Por conta disso, perdemos as ações afirmativas em locais como Califórnia, Texas, e Michigan. Eu acho que o Brasil pode utilizar esse exemplo para não cair no mesmo erro.

CB - A senhora falou em estudantes latinos. Há a necessidade de políticas que envolvam outros grupos que não somente os negros?
AD - Penso que devemos dar um passo além do paradigma branco x negro e construir um movimento que preste atenção em outros grupos racializados e discriminados. Nos EUA, temos que acolher particularmente os imigrantes: latinos, asiáticos e também africanos. No Brasil, o desafio é assimilar também a população indígena, devastada durante a colonização.

CB - Nos últimos dez anos, a senhora tem se dedicado à luta contra os sistemas prisionais. O que a faz pensar que a liberdade dessas pessoas pode fazer uma sociedade mais justa?
AD - A simples constatação de que as prisões não resolvem nada. O crime é uma questão de pobreza e segregação racial. Devem existir outras formas de se lidar com essas questões. O cárcere isola essas pessoas, mas não resolve a origem. Em 1968, havia menos de duas mil pessoas atrás das grades nos EUA. Já considerávamos um número grande. Hoje, nós temos dois milhões e 300 mil pessoas, e a maioria da população carcerária é negra. Não tem como não pensar que a luta contra o sistema carcerário é uma luta contra a desigualdade racial.

CB - Essa disparidade não deve ser tão diferente no Brasil...
AD - Não tenho base para comparar por não conhecer bem o sistema daqui. Mas sei que existem semelhanças. Na verdade, a preponderância de presos é de origem negra em todo o mundo. Em todo lugar, o sistema racista encarcera os que não tiveram oportunidades no sistema capitalista.

CB - Como a senhora disse, a sua formação é comunista. O próprio Panteras Negras era um movimento fundamentado no comunismo. A sua postura sempre reta a faz comunista ainda hoje?
AD - Li Marx pela primeira vez no 2º grau e me filiei ao partido comunista há exatos 40 anos, em 1968. Ao mesmo tempo, militava entre os Panteras Negras. Utilizava a análise comunista de classes com um viés racial. Devido a conflitos naturais, saí do partido em 1991, mas nunca mudei minha postura em relação ao capitalismo. Posso dizer que hoje sou uma comunista com “c” minúsculo.

Correio da Bahia, 11.08.2008
www.correiodabahia.com.br

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